Combate à exposição, erotização e abuso sexual de crianças nas plataformas digitais domina debates na CMB

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A denúncia feita em vídeo pelo youtuber e humorista brasileiro Felca (Felipe Bressanim Pereira), no último dia 6, sobre abusos e exploração sexual de crianças nas plataformas digitais, dominou os debates nos horários de pronunciamentos individuais (Expediente), de bancadas (Horário das Lideranças) e de apresentação de requerimentos (Primeira Parte da Ordem do Dia) na Câmara Municipal de Belém, nesta quarta-feira (13). Todos os oradores cobraram providencias do poder publico para coibir esses crimes e tiveram em comum, em seus discursos, a palavra união. O tema foi defendido como pauta humanitária e acima de questões partidárias e ideológicas.

Michel Durans (PSB), primeiro a registrar a denúncia de Felca na tribuna, disse que o parlamento brasileiro não pode ficar indiferente a essa pauta e sugeriu que o prefeito de Belém, Igor Normando, construa um programa de conscientização, na rede de educação municipal, sobre o cuidado que se deve ter com crianças na internet, porque “agora o perigo mora no celular”, como salientou.

Um trabalho conjunto do Legislativo e órgãos municipais e estaduais, para debater ações contra a exploração sexual infantil, foi a sugestão de Nay Barbalho (MDB). Ela se confessou ingênua por não ter detectado antes o que vê agora como sistematização e profissionalização da pedofilia no Brasil. “Eu, como mãe de uma criança de 11 anos de idade, achava que botando um aplicativo no celular e proibindo que meu filho tivesse acesso a conteúdos de adultos ou 12+ ele estaria protegido. No entanto, me deparo com uma rede sistematizada, que expõe nossas crianças numa bandeja nas redes sociais. Estou estarrecida com os casos que fui estudar a fundo”, lamentou.

Nay Barbalho exemplificou a gravidade da situação de exploração vivida por crianças brasileiras com casos citados por Felca em que meninas são filmadas e exibidas na internet com “cada vez menos roupas”, porque suas famílias perceberam a subida de visualizações e de curtidas à medida em que as roupas diminuem e despertam o interesse de internautas pedófilos.  “Aí monetiza e vira dinheiro. Eu não poderia vir a essa tribuna hoje e não falar sobre responsabilidades. São muitas. Temos a responsabilidade de famílias que usam suas crianças para fazer dinheiro. Temos a responsabilidade das redes sociais que entregam nossas crianças de bandeja para o algoritmo P. Agora mesmo, se um de vocês, entrar numa rede social e der uma curtida num vídeo de uma criança dançando, as redes entenderão que vocês gostam desse conteúdo e vão cada vez mais entregar esse tipo de imagens e conteúdo para vocês. E temos os pedófilos, que estão tranquilos, recebendo de bandeja todo esse conteúdo; e influenciadores que vivem à base de exploração sexual de crianças. Como isso pode ser divertido? Como exibir crianças com pouca roupa pode ser considerado um trabalho?”, perguntou, mostrando indignação.

A solução, segundo Nay Barbalho, passa também pelo Legislativo, que pode propor medidas e participar da elaboração e aperfeiçoamento da política municipal de proteção às crianças, incluindo apoio aos conselhos tutelares e fiscalização através de órgãos como a Delegacia de Crimes Cibernéticos e de instrumentos como a Rede Municipal de Proteção à Criança e ao Adolescente. “Precisamos nos unir. Isto não é pauta política. Não é de direita ou esquerda.  É uma pauta humanitária. Nossas crianças estão sendo servidas nas redes sociais para homens e mulheres que consomem esse conteúdo”, pregou.

Alfredo Costa (PT) apresentou requerimento, em regime de urgência, “independente de questões partidárias ou ideológicas”, para que a Casa encaminhe ofício aos membros da bancada federal paraense (deputados e senadores) solicitando adesão e pleno engajamento ao esforço nacional pela aprovação da legislação rigorosa que regulamenta e fiscaliza as plataformas digitais. “As plataformas ganham bilhões e bilhões, seja Facebook, Instagram, X ou YouTube. Estão ficando cada vez mais bilionárias e parte desse dinheiro se origina na exploração sexual de crianças e adolescentes. A Câmara Municipal de Belém tem de se engajar nessa luta, para garantir, que o sonho, a esperança e o futuro dessas crianças não sejam interrompidos. Que as crianças usem as redes sociais, mas com garantias. Existe tecnologia pra isso”, afirmou. Sem citar nomes, Costa disse que em Belém também existem influenciadores digitais que estão expondo crianças na internet.

Pablo Farah (MDB) lembrou que a Câmara de Belém já aprovou lei para coibir crimes de cyberbullying. Segundo ele, esse assunto já frequenta o parlamento há algum tempo, mas ganhou projeção nacional com a denúncia feita pelo influenciador Felca. Farah também destacou que a exploração sexual de menores na internet é uma atividade que não se limita a fronteiras geográficas e é impulsionada por quadrilhas internacionais. “É um tema que a gente precisa sempre estar lembrando na casa legislativa”, defendeu Farah, acrescentando, contudo, que o assunto deve ser levado às salas de aulas para ter eficácia real.

Fabio Souza (MDB) reconheceu a importância do projeto de responsabilização das redes citado por Alfredo Costa, mas destacou também a responsabilidade dos pais na questão. “Essa responsabilidade é clara, objetiva e concorre para que aconteça hoje o que estamos vendo: pais ganhando dinheiro”, criticou. Segundo ele, a Rede de Proteção à Criança e ao Adolescente está completamente desarticulada.

Vivi Reis (PSOL) também identificou o tema como recorrente no parlamento nos últimos anos e comemorou a viralização da denuncia que dominou as redes desde a semana passada e proporcionou a projeção requerida pela importância do assunto, que já foi tema de sessão especial promovida por ela e outros vereadores na Câmara de Belém. “Já vimos debatendo as questões tanto da regulamentação da internet, que é diferente de censura, quanto do abuso e da exploração sexual de menores nas redes. Precisamos ter uma preocupação com a exposição e a objetificação das crianças, em especial de meninas. Vejo que esse é um tema que une muitos de nós. Inclusive vereadores e vereadoras da base do governo municipal apontaram aqui a importância de que nas escolas seja abordado esse tema, para que a criança saiba como se proteger e como se posicionar diante desse assunto, preservando sua integridade física”, observou a vereadora.

Reis também se disse surpresa com o arquivamento de seu projeto sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) nas escolas. “Esse projeto foi arquivado pela Comissão de Justiça e Legislação sob a alegação de que não abordamos o impacto financeiro. Na prática, esse projeto é uma reestruturação de currículo nas escolas municipais, que é essencial para que nós possamos garantir que as crianças e adolescentes conheçam seus direitos e deveres e possam também atuar junto com o conjunto da sociedade no combate ao abuso e exploração sexual”, explicou.

Josias Higino (PSD) pediu registro nos anais da Casa de matéria publicada no jornal O Liberal, edição de 13.08.2025, sob o título “SBP exige regras contra abuso de crianças” e parabenizou o Congresso Nacional pela apreciação do projeto de lei 2628/2022, já aprovado no Senado Federal, que dispõe sobre a proteção de crianças e adolescentes em ambientes digitais.

Marinor Brito (PSOL) lembrou que a Câmara Municipal de Belém já foi palco de uma CPI sobre abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes, em 2005, que resultou na produção de um relatório detalhado e de um livro mostrando rotas desse tipo de exploração em Belém e desta cidade para o exterior.  “Mostramos os pontos e pesquisas que denunciavam a incidência dessa violação de direitos em todos os bairros”, disse a vereadora, salientando que desde aquela época já “estavam na mesa” dados e detalhes sórdidos de casos como o de uma criança de seis meses sendo abusada na frente de uma câmera para venda da filmagem ou de crianças imobilizadas pelos próprios pais para sofrer abusos sexuais filmados.

“É muito difícil enfrentar essa rede de criminosos neste país. Mas este alerta precisa ser dado e ninguém pode cruzar os braços. Acabamos de ver o ex-deputado Seffer condenado na justiça federal, por crime de pedofilia, e ele está solto! As OS dele estão ganhando licitações em várias esferas do estado. Esse tipo de crime está naturalizado, aqui e na Assembleia Legislativa. Ninguém quer se comprometer. Porque é o deputado, porque é o vereador, porque é o pastor, porque é o padre, porque é o pai, porque é um amigo, porque é o vizinho!”, protestou. Finalizou desejando que “a classe política levante a bunda da cadeira e ajude a combater os crimes sexuais contra crianças e adolescentes”.

Texto: Socorro Gomes
Fotos: Jackson Muriel – SERFO/Arquivo DICOS

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